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A BUSCA PELO CORPO IDEAL

Anorexia e bulimia são os transtornos alimentares mais comuns entre mulheres jovens

 

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A anorexia atinge mais de 150 mil pessoas por ano no Brasil, segundo dados divulgados no ano de 2017 pelo Hospital Israelita Albert Einstein, sendo que os principais alvos da doença são mulheres entre 15 e 24 anos. Entre os casos de anorexia existentes no país, cerca de 15% dos pacientes vem a óbito anualmente. É o transtorno psiquiátrico que mais mata no mundo, conforme estudos do laboratório do Centro de Pesquisa em Transtornos Alimentares da Universidade Loughborough.  

 

Já a bulimia registra mais de 2 milhões de casos por ano no país, ainda segundo a pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein. O surgimento deste distúrbio, mais recorrente que a anorexia, é mais raro na infância e geralmente surge a partir dos 13 anos de idade. O transtorno atinge, em média, mulheres com aproximadamente 20 anos, segundo os autores Majid SH e Treasure JL em “Eating disorders”.

 

 

 

 

 

De acordo com a nutricionista Ana Carolina Gonçalves, o tratamento para pacientes que sofrem de anorexia e bulimia deve ser gradual. Primeiro, é preciso fazer uma avaliação para calcular o Índice de Massa Corporal (IMC) e o percentual de gordura da pessoa, além da rotina alimentar: em quais horas do dia costuma comer, quantas refeições faz por dia, o que ingere e em qual quantidade. Tendo essas informações, a nutricionista afirma que já é possível iniciar um tratamento e uma reeducação alimentar.

 

Ana Carolina explica que não adianta tentar fazer a pessoa comer tudo o que ela não está acostumada de um dia para o outro. É necessário ter calma e iniciar a dieta com pequenas porções de comida, de acordo com as preferências do paciente. Aos poucos, é possível aumentar essas quantidades de comida e incentivando o consumo de alimentos saudáveis, que realmente sustentam. “Se a paciente sentir que o processo está indo rápido demais e não dar conta da dieta, é preciso retroceder e acompanhar o organismo dela”, ressalta.

 

A nutricionista explica ainda que é muito importante deixar claro o papel de cada alimento indicado na dieta para o organismo do ser humano e, assim, incentivar a ingestão. Outro fator essencial no tratamento da anorexia e da bulimia é o acompanhamento do profissional e o apoio da família.

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Lara Borges é estudante de nutrição e aos 19 anos desenvolveu um quadro de anorexia que começou devido a um problema de gastrite, seguido de uma reeducação alimentar e logo perda de peso. "Quando comecei a emagrecer eu fui gostando muito de como eu estava ficando. Só que daí virou uma busca incansável por aquele corpo que eu queria. Eu sempre fui muito alta, então eu sempre olhava qual era o peso das modelos e tentava alcançar aquilo. Eu tinha 70 quilos na época e hoje eu peso 54 quilos. Eu pensava que eu ia chegar nos 65 quilos e ia parar. Eu chegava nos 65 quilos e eu baixava cada vez mais a meta".

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Lara relata que passou a não sair mais de casa para comer fora e que começou a pesar os alimentos que comia, desde frango a pepinos e alface. "Só entrava na minha boca se eu soubesse qual era a quantidade de gramas que estava entrando. Eu comia aquilo e mais nada depois, e me entupia de água". Quando a estudante percebeu o quão magra estava e foi ao seu endocrinologista, ele a diagnosticou com anorexia e  informou que se ela continuasse sem comer, teria somente dois meses de vida.

 

A esse ponto, Lara tinha 4% de gordura em seu corpo, pesava 47 quilos, parou de menstruar e teve queda de cabelo. "Só que eu não aceitava que ele dissesse 'coma', pois eu não via a comida como uma coisa boa e eu tinha a atenção dos meus pais daquele jeito, então era isso que eu queria", afirma Lara, que também contou que não estando saudável conseguiria mais carinho e atenção da mãe, a fim de suprir a sua carência materna. Para sair do quadro de anorexia, a estudante buscou uma nutricionista e acompanhamento psicológico, que mantém até hoje.

 

 

A psicológica e professora Célia Ferreira aponta que tanto a anorexia quanto a bulimia são uma distorção da auto imagem e surgem como uma resposta sintomática a algum conflito que explode a partir de alguns gatilhos. "Esses gatilhos podem ser a própria dinâmica familiar conflituosa. Normalmente é uma relação que se estabelece entre a mãe e a menina, já que os transtornos alimentares são prioritariamente casos femininos. Além dessa dinâmica familiar, há a preocupação exagerada com o corpo ou com a comida, e a própria cultura atual da exaltação do corpo e da perfeição estética. O que existe no transtorno alimentar é um corpo que parece nunca satisfazer e que está sempre devendo a um ideal inacessível".

 

A psicóloga afirma que o transtorno alimentar eclode na transição da infância para a adolescência normalmente entre os 11 e 18 anos de idade. Segundo ela, os principais sintomas da anorexia são o jejum, as purgações usadas com laxante e o excesso de exercício físico. Já no caso da bulimia, mais difícil de ser percebida já que não há perda de peso, os principais sintomas são a purgação com uso de laxante, o vômito induzido, a ingestão exacerbada de calorias que pode chegar até 15 mil, o desgaste do esmalte do dente pelo ácido do vômito e trauma na faringe.

 

Para Célia, o melhor tratamento é um que envolva a família, que possa ser desenvolvido por uma equipe multidisciplinar com um psiquiatra, um psicanalista e um nutricionista. "O maior problema do transtorno alimentar é que ele é considerado um transtorno para o outro, para os pais, para os familiares, mas ele não é visto assim pelo próprio sujeito, que não quer se curar disso, ele não reconhece isso como algo que ele tem que se livrar", explica a psicóloga.

 

 

A estudante de comunicação organizacional Mariele Figueiro, de 21 anos, era apenas uma pré-adolescente quando recebeu orientações de uma pessoa próxima dizendo que ela estava ganhando muito peso e precisava perder alguns quilos, porém, na realidade, estava apenas entrando na puberdade à sua maneira. Por conta desse comentário e de outros similares, acabou desenvolvendo o transtorno da bulimia.

 

O distúrbio alimentar fez parte da vida da jovem por cerca de cinco anos. Ela percebeu que estava doente quando se viu buscando métodos eficazes para perder peso rapidamente e continuar tendo práticas não saudáveis em relação à alimentação por meio de blogs na internet. "Eu acompanhava o site de uma menina que falava para a gente não desistir e continuar buscando a Ana e a Mia (apelidos “carinhosos” para anorexia e bulimia). Somente assim era possível ficar linda e se encaixar nos padrões de beleza", diz.

 

Além de ser bulímica, Mariele ainda sofria com a automutilação, uma forma utilizada por ela para se punir quando cometia algum deslize ou não conseguia cumprir com a expectativa de seu corpo ideal. Quando não atingia o resultado que queria, ela tinha picos de estresse e acabava descontando sua frustração na comida e logo em seguida no seu próprio corpo.

 

Ela ressalta que não procurou tratamento, pois a família não entendia muito bem o que estava acontecendo com sua vida. "Eu achava que se eu contasse, eles iriam pensar que eu estava querendo chamar a atenção e que eu não precisava passar por aquilo. Por isso, eu não contava a ninguém e guardava tudo pra mim, sendo que isso só piorava a minha situação", conta com lágrimas nos olhos.

 

Dessa maneira, ela frisa que pessoas que estão passando por distúrbios alimentares devem procurar tratamento da maneira mais rápida possível, pois fica mais difícil de se lidar quando se está sozinho(a). Atualmente seus pais têm consciência do que ela passou e lhe dão todo o suporte necessário. Além disso, a estudante ainda conta com o apoio dos amigos e também de sua psicóloga. Ela explica que optou por fazer terapia como uma forma de se conhecer melhor e também de se fortalecer como pessoa para que não volte ao que lidava antes.

 

Sobre possíveis recaídas, ela ressalta que quando se vê em situações complicadas tenta respirar fundo e pensar no que realmente é importante, seguindo os seus princípios. Mariele tenta viver um dia de cada vez porque, conforme orientações da sua psicóloga, ela não consegue enxergar o dia de amanhã mas precisa garantir pelo menos o dia de hoje. Segundo ela, é o que tem funcionado e deixado sua mente mais calma em momentos com prováveis gatilhos.

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